segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Poemas de Cecília Meireles para crianças



O menino azul

O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.
 
O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios, 
das montanhas, das flores,
— de tudo o que aparecer.
 
O menino quer um burrinho
que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos 
e com barquinhos no mar.
 
E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim 
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.
 
(Quem souber de um burrinho desses, 
pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)

Colar de Carolina


Com seu colar de coral,
Carolina 
corre por entre as colunas
da colina.
 
O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.
 
E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina, 
põe coroas de coral
 
nas colunas da colina.

O cavalinho branco


À tarde, o cavalinho branco
está muito cansado:
 
mas há um pedacinho do campo
onde é sempre feriado.
 
O cavalo sacode a crina
loura e comprida
e nas verdes ervas atira 
sua branca vida.
 
Seu relincho estremece as raízes
e ele ensina aos ventos
 
a alegria de sentir livres
seus movimentos.
 
Trabalhou todo o dia, tanto!
desde a madrugada!
 
Descansa entre as flores, cavalinho branco,
de crina dourada!

Leilão de jardim


Quem me compra um jardim
com flores?
 
borboletas de muitas
cores,
 
lavadeiras e passarinhos,
 
ovos verdes e azuis 
nos ninhos?
 
Quem me compra este caracol?
 
Quem me compra um raio
de sol?
 
Um lagarto entre o muro
e a hera,
 
uma estátua da Primavera?
 
Quem me compra este formigueiro?
 
E este sapo, que é jardineiro?
 
E a cigarra e a sua
canção?
 
E o grilinho dentro
do chão?
 
(Este é meu leilão!)

O mosquito escreve


O mosquito pernilongo
trança as pernas, faz um M,
depois, treme, treme, treme,
faz um O bastante oblongo,
faz um S.
 
O mosquito sobe e desce.
Com artes que ninguém vê,
faz um Q,
faz um U, e faz um I.
 
Este mosquito
esquisito
cruza as patas, faz um T.
E aí, 
se arredonda e faz outro O,
mais bonito.
 
Oh! 
Já não é analfabeto, 
esse inseto,
pois sabe escrever seu nome.
 
Mas depois vai procurar 
alguém que possa picar,
pois escrever cansa, 
não é, criança?
 
E ele está com muita fome.

Sonhos da menina


A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?
 
Sonho 
risonho:
 
O vento sozinho
no seu carrinho.
 
De que tamanho 
seria o rebanho?
 
A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha . . .
 
Na lua há um ninho
de passarinho.
 
A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?

Ou isto ou aquilo


Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
 
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
 
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
 
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
 
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
 
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo . . .
e vivo escolhendo o dia inteiro!
 
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
 
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

A pombinha da mata


Três meninos na mata ouviram
uma pombinha gemer.
 
"Eu acho que ela está com fome", 
disse o primeiro,
"e não tem nada para comer."
 
Três meninos na mata ouviram 
uma pombinha carpir.
 
"Eu acho que ela ficou presa",
disse o segundo,
"e não sabe como fugir."
 
Três meninos na mata ouviram
uma pombinha gemer.
 
"Eu acho que ela está com saudade",
disse o terceiro,
"e com certeza vai morrer."

Retirado de: http://www.revista.agulha.nom.br/ceciliameireles07.html. Acesso em: 26/09/2011



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